Quando um grande número de pessoas
ocupa um determinado espaço, fisicamente bastante próximas umas das
outras, durante algum tempo, forma-se uma multidão. Ela pode assumir
personalidade própria que passa a definir suas atitudes, como se as
personalidades dos indivíduos que a compõem se fundissem em uma só.
É o caso dos protestos, passeatas, caminhadas, romarias que atuam
com mais ou menos intensidade de tempos em tempos. Há quem não lhe
dê maior importância. Há os que lhe dão grande valor como atores
políticos ou testemunhos de fé.
Jesus também esteve constantemente
interagindo com a multidão. A forma autônoma como ela atuou nos
obriga a considerá-la personagem importante dos evangelhos, ao lado
de Pedro, Maria, José e outros indivíduos. Como estes, ela tomou
atitudes mais ou menos louváveis, tendo sido igualmente aprovada ou
repreendida pelo mestre. Certa vez, ela quis aclamá-lo rei, e ele se
esquivou. No dia seguinte, foi por ele censurada porque o seguia
interessada apenas no pão material. Na sua entrada em Jerusalém,
saudou-o como o rei que vem em nome do Senhor. No final da
mesma semana, gritaria: Crucifica-o.
Mas este blog inspira-se no papel que
desempenhou nos acontecimentos relatados no capítulo sete do
evangelho de João, especialmente do versículo 45 ao 52. Os soldados
enviados pelos principais sacerdotes e fariseus para prender Jesus
voltaram sem ele e dizendo: Jamais alguém falou como esse homem.
A resposta que ouviram foi: Será que também fostes enganados?
Porventura, creu nele alguém dentre as autoridades ou algum dos
fariseus? Quanto a
esta plebe que nada sabe da lei, é maldita.
Com certeza, não é de se estranhar
que muitos dentre a multidão tenham crido em Jesus, enquanto os
doutores da lei ainda supunham poder neutralizá-lo a força, pois é
próprio do Deus dos evangelhos revelar certas coisas aos pequeninos
e ocultá-las aos sábios e instruídos que não têm compromisso com
a verdade. Observa-se também nesse episódio que essa fé teve o
poder de paralisar os guardas e fazer aflorar a de Nicodemos, que se
mantivera calado por algum tempo, inseguro, porque também era
fariseu.
Para o cientista, o ato divino é uma
hipótese que precisa ser submetida a experimentações e
comprovações, para adquirir no máximo status de provável. O
filósofo o acataria depois de submetê-lo a rigorosas argumentações
lógicas e ao pensamento de seus pares consagrados. O teólogo poderá
até acolhê-lo, se seu compromisso for com a verdade e não com a
integridade de seu sistema teológico, muitas vezes comprometido com
interesses duvidosos.
Para
o sedento, ele é água, da qual depende para recuperar a vida que se
esvai. Não há tempo para análises químicas, nem reflexões sobre
a importância do precioso líquido para o metabolismo do corpo
humano. Nem precisa, é algo que se procura, que se espera, com
ansiedade. O acolhimento é imediato, com alegria, e ações de
graça. A sede nivela o cientista, o filósofo, o teólogo, o rico, o
pobre. Faz de todos apenas mais um na multidão.