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Porventura, creu nele alguém dentre as autoridades ou algum dos fariseus?
Quanto a essa plebe, que nada sabe da lei, é maldita... (João 7.48-49)

quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Eu, multidão

Quando um grande número de pessoas ocupa um determinado espaço, fisicamente bastante próximas umas das outras, durante algum tempo, forma-se uma multidão. Ela pode assumir personalidade própria que passa a definir suas atitudes, como se as personalidades dos indivíduos que a compõem se fundissem em uma só. É o caso dos protestos, passeatas, caminhadas, romarias que atuam com mais ou menos intensidade de tempos em tempos. Há quem não lhe dê maior importância. Há os que lhe dão grande valor como atores políticos ou testemunhos de fé.
Jesus também esteve constantemente interagindo com a multidão. A forma autônoma como ela atuou nos obriga a considerá-la personagem importante dos evangelhos, ao lado de Pedro, Maria, José e outros indivíduos. Como estes, ela tomou atitudes mais ou menos louváveis, tendo sido igualmente aprovada ou repreendida pelo mestre. Certa vez, ela quis aclamá-lo rei, e ele se esquivou. No dia seguinte, foi por ele censurada porque o seguia interessada apenas no pão material. Na sua entrada em Jerusalém, saudou-o como o rei que vem em nome do Senhor. No final da mesma semana, gritaria: Crucifica-o.
Mas este blog inspira-se no papel que desempenhou nos acontecimentos relatados no capítulo sete do evangelho de João, especialmente do versículo 45 ao 52. Os soldados enviados pelos principais sacerdotes e fariseus para prender Jesus voltaram sem ele e dizendo: Jamais alguém falou como esse homem. A resposta que ouviram foi: Será que também fostes enganados? Porventura, creu nele alguém dentre as autoridades ou algum dos fariseus? Quanto a esta plebe que nada sabe da lei, é maldita.
Com certeza, não é de se estranhar que muitos dentre a multidão tenham crido em Jesus, enquanto os doutores da lei ainda supunham poder neutralizá-lo a força, pois é próprio do Deus dos evangelhos revelar certas coisas aos pequeninos e ocultá-las aos sábios e instruídos que não têm compromisso com a verdade. Observa-se também nesse episódio que essa fé teve o poder de paralisar os guardas e fazer aflorar a de Nicodemos, que se mantivera calado por algum tempo, inseguro, porque também era fariseu.
Para o cientista, o ato divino é uma hipótese que precisa ser submetida a experimentações e comprovações, para adquirir no máximo status de provável. O filósofo o acataria depois de submetê-lo a rigorosas argumentações lógicas e ao pensamento de seus pares consagrados. O teólogo poderá até acolhê-lo, se seu compromisso for com a verdade e não com a integridade de seu sistema teológico, muitas vezes comprometido com interesses duvidosos.
Para o sedento, ele é água, da qual depende para recuperar a vida que se esvai. Não há tempo para análises químicas, nem reflexões sobre a importância do precioso líquido para o metabolismo do corpo humano. Nem precisa, é algo que se procura, que se espera, com ansiedade. O acolhimento é imediato, com alegria, e ações de graça. A sede nivela o cientista, o filósofo, o teólogo, o rico, o pobre. Faz de todos apenas mais um na multidão.